quarta-feira, 2 de julho de 2014

Espólio Sangrento V

O5: Uma nova chance

Talvez, todos os outros escravos e prisioneiros estavam dormindo. Já que a única sombra que se movia diante o lugar pouco iluminado era uma silhueta pequena, nãos mais que um metro e trinta centímetros. O detentor da sombra movia-se suavemente, seus pés moviam-se iguais as patas de gatos e seus olhos escuros e pequenos observavam tudo ao seu redor atentamente. As mãos gélidas estavam ocupadas. Com certeza estavam. Estava a duas horas lutando para conseguir que suas mãos estivessem ocupadas agora. A mão direita segurava o rabo de uma grande ratazana e a esquerda a cabeça, cuidadosamente para não ser mordida. Vlad moveu-se ligeiramente, como se estivesse em uma dança real: Suave, delicado, firme e sem fazer barulho entre os escravos dormindo. Não se importou em certificar-se se o velho Iikin estava dormindo. Não iria fazer muita diferença, aquela brincadeira era dele. Apenas dele. Chegaram á alguns metros do velho que estava dormindo. E continuou caminhando até chegar ao fim do grande pátio sombrio. As paredes eram cinza e o canto dividido por duas paredes agora era pouco iluminado. Você é minha agora. Apenas eu e você! Ele pensou quando levantou a ratazana até a altura de seus olhos e viu o bicho se contorcendo em seus dedos. A pequena boca da criatura fecha-se e abria. Tentando morder algo. Você quer morder? Você não vai ter esse prazer me desculpe. Deixou a criatura pelos dedos que segurava a cabeça dela. A outra mão desceu pela sua cintura e vasculhou os bolsos da causa velha, procurando algo que lhe fosse útil. A lagrima da morte, não, não quero isso agora. Levou a mão até o outro bolso. Um galho fino, o que vou fazer com a merda de um galho fino. Puxou o galho e encostou cuidadosamente a criatura minúscula contra a parede. Pressionou a cabeça da criatura com força contra o concreto gélido e a ratazana soltou um grunhido baixo. O barulho que era de dor invadiu os tímpanos de Vlad, lhe proporcionando uma sensação prazerosa e confortante. Doeu? Que ótimo! Pensou e depois voltou a pressionar a cabeça do bicho de novo contra a parede. A ratazana ficou lá, se debatendo e sentindo a pressão contra suas pressas e grunhindo, grunhindo.  Vlad olhou a outra mão e a madeira fina. Essa tinha uns dez centímetros e um de espessura. O que vou fazer. Como vou torturar uma Ratazana deste tamanho (A coitada tinha quase o mesmo tamanho de madeira, porém era gorda, bem gorda).

Os olhos percorreram o corpo do pobre animal. Pegou a madeira e deu uma leve estocada nas costas do bicho que estava sendo pressionando contra a parede a mesma esguichou de dor, e novamente ele ouviu uma aconchegante melodia.

- Nunca tentou empalar essas criaturas, pequeno Vlad? – A voz silenciosa veio de trás de si. Vlad estava tão concentrando que levou um susto e virou-se com os pulsos fechados. Soltando a ratazana. A mesma caiu no chão com os pelas cinzas da barriga coberta por sangue. Poderia ter arriscado morde o pé de Vlad, mas talvez seus dentes já estivessem todos quebrados. Ela cambaleou e fugiu.  Haaa. Minha companhia fugiu por que me assustei com o desgraçado deste velho!

O velho Iikin estava parado atrás dele, sem expressão alguma. Caso conseguisse enxergar, iria ver a expressão frustrada no rosto de Vlad e talvez tremer de medo. Esse desgraçado não é cego?

Como andou até aqui? – Perguntou o pequeno Vlad, recompondo-se e aceitando a ideia de ter perdido a sua caça.

- Os homens respiram muito altos enquanto dormem e você faz muito barulho quando anda. Posso ter ficado cego, mas meus outros sentidos ficaram mais aguçados. Estranho não? – Os olhos do velho eram brancos e seu rosto enrugado e negro.
Esse desgraçado sabe algum tipo de feitiço? Conhece sobre a Lágrima da morte, pode conhecer algum feitiço. Pensou em perguntar, mas acabou perguntando outra coisa. – Que droga é essa? Empalar? – Perguntou o garoto enquanto começava a andar em direção do velho, quando ele passou por ele, cuidadosamente sem fazer barulho algum o velho se virou e respondeu.

- É uma espécie de tortura. Eu ouvi o barulho da madeira quando você a pegou. Parecia ser fina e inútil para aquela ratazana. Ela era grande não era? Seu grunhido me disse isso.
Que velho..

- Sim eu estava com uma madeira. – Continuou Vlad, ganhando uma expressão de surpresa em seu rosto. Não só pela descoberta da madeira, mas por ele ter se virado exatamente no momento que passou por ele. Minha respiração, com certeza.

- Use-a da próxima vez. Penetre a criatura pelo ânus e faça a madeira sair pela sua goela, talvez você goste. – Terminou o velho Iikin, caminhando de volta para seu lugar de descanso. Vlad notou que este sempre mantinha a mão esquerda encostada na parede e quando pensou que ele fosse pisar na cabeça de um escravo também velho e se contorcendo. Ele parou e deu um passo maior, caminhando sem problema nenhum para sua cama de panos velhos.
                                                        ~~

- Senhor. – Radu estava deitado na cama grande do Sultão enquanto o mesmo se olhava diante o espelho de prata, tendo em seus dedos um pequeno receptáculo de uma alguma fragrância exótica. O cheiro espalhava-se por todo o local. O sultão trajava uma túnica branca que se estendia até os pés.

- Diga garoto! – Respondeu o Sultão sem olhar para trás.

- As noites.. tenho sido um bom menino. Isso dói, mas às vezes é bom. Mas tenho sido um bom menino para que você possa... - O garoto hesitou, estava deitado sobre toalhas de cetins. Sentia-se desconfortado sentado, então permanecia deitado.

- Diga garoto! Não tenho muito tempo. Logo irei encontrar seu Pai. Precisamos atualizar algumas coisas. A Hungria tem ficado em silêncio há muito tempo. Isso não me agrada.
Meu pai. Vlad Tepes II. Pensou Radu, sentiu uma pontada de felicidade em seu coração ao se lembrar da família. Mas logo entristeceu ao lembrar também que fora exatamente seu pai que tinha dado ele e o irmão ao Sultão. Suspirou, segurando as lágrimas e voltou ao assunto principal.

- Meu irmão. Ele já está há muito tempo com aqueles escravos. Eu tenho medo. Tenho medo de que algo possa acontecer a ele. – O som de voz do garoto era baixo, quase um sussurro. Ele tinha medo do Sultão, muito medo e isso agradava o Rei dos Otomanos.

- Medo? Eu temo pela vida dos meus escravos. Aquele garoto não é igual a você! É pior que meus soldados menino. Ele está tendo uma alimentação todos os dias. Está bem tratado, nenhum dos escravos ousa chegar perto dele. Um dos meus soldados já avisou que se algo acontecer com aquele menino. A morte será um grande alivio para aquele que o machucar.
Radu sentiu-se um pouco mais aliviado. Mais por que Mehmed II dissera aquilo. Que ele era diferente? Realmente, seu irmão era estranho. Mas pior que os soldados do Sultão?

- E. Eu... Posso vê-lo? – Perguntou cautelosamente o garoto, com tanto medo que mal conseguiu falar.

- Não entendi garoto! – O sultão nunca o chamou pelo nome. Talvez nunca o lembrasse.

- Eu. Posso... Ver meu irmão? – Radu manteve os olhos para baixos e fechados. Já esperava ouvir um grito, um insulto, mas não foi aquilo que ouviu.

- Podemos resolver isso outra hora! – Respondeu o gordo Sultão.

~~

Dois dias e uma noite havia-se passado desde que o velho Iikin quase o matara de susto e tinha falado sobre ‘’Empalar’’. Vlad ficou muito curioso por esse tipo de tortura. Queria demasiadamente fazer aquilo, achou até um pouco excitante. Será que posso fazer com humanos? Quem sabe um dia. Talvez um dia se eu for Conde, Príncipe, Rei. Irei fazer isso com meus prisioneiros. Mas primeiro. Com certeza tenho que experimentar com alguma ratazana e fugir desse inferno. Preciso fugir daqui.  Vlad já estava há alguns meses naquele lugar, como prisioneiro. Os primeiros meses foram em um lugar um tanto que confortável. Mas agora.

Já tinha conversando com o velho Iikin sobre o assunto várias vezes. No começo o velho não queria saber sobre o assunto, sempre falava a mesma coisa. ‘’ Não quero falar sobre isso. Não quero ter uma parte na sua morte’’

Mas Vlad era abusado, sabia que o Sultão não o mataria, poderia torturá-lo, mas não o mataria. Depois de algum tempo, sempre insistindo. O velho começou a ouvir as ideias de Vlad e sempre achava um erro nelas. Aquilo irritava Vlad, mas ele sabia que o velho estava certo. Na noite anterior, quando voltou frustrado por não conseguir capturar nenhuma ratazana ou rato o velho o surpreendeu puxando assunto.

- Eu sei como você pode fugir. – Murmurou o cego, deitado para o lado ao contrário que Vlad estava. Vlad sentou-se, olhando para todos os lados, certificando que todos os homens estavam deitados e dormindo.

- Como? – Perguntou. Os cabelos do garoto já tinham passado dos ombros e estavam sujos e com um mau cheiro.

- Quando te levarem para fora daqui. Irá subir uma escada subterrânea. Essa escada vai 
passar por dois andares. O primeiro é uma porta que leva a um corredor. Esse corredor leva para além dos muros do castelo. O segundo andar é o térreo do castelo. Consiga atravessar a porta do primeiro andar sozinho que estará livre.

Vlad demorou a dormir naquela noite. Pensou e repensou como iria conseguir fugir. Quando fosse levado daquele lugar, com certeza estaria escoltado com alguns soldados. Mas não demorou muito para sua mente maquiavélica pensar em algo. Adormeceu segurando o pedaço de madeira fina, o protegendo de qualquer um que pudesse quebrá-lo.

Vlad sabia quando era dia e noite não só pelo seu relógio biológico, mas por causa dos horários que os soldados traziam o seu alimento. Os outros escravos gritavam pragas e ofensas enquanto o garoto dividia a comida com o velho Iikin, mas nenhum ousava a roubar a comida do garoto.

 O barulho da grande porta de aço se abrindo no outro lado do pátio chamou a atenção de todos. A porta rangia e o barulho ecoava por todo o lugar. Dois soldados trajados de armaduras de prata e espada na mão e punhais na cintura adentraram o local.           

   Vlad fitou com atenção os homens e percebeu que nenhum trazia comida. Por Deus, estou com fome... Pensou e o mais alto dos soldados berrou.

- Vlad Tepes III – Gritou o homem!
Todos os escravos olharam para a mesma direção. Vlad hesitou em se levantar e o velho Iikin sussurrou.

- Talvez seja essa sua chance, pequeno Vlad. A primeira porta. A primeira porta.
Vlad olhou para o velho e colocou as mãos nos bolsos. Em um estava a Lágrima da Morte e em outro o pedaço de madeira. Deixou um sorriso pequeno no rosto e se levantou. Caminhando em direção dos soldados. Os escravos o fitavam com ódio nos olhos. Claro que me odeiam. Tenho mais privilegio que eles..

Parou diante os soldados. Mantendo uma expressão fria, sem nenhum tipo de sentimento. O maior colocou a mão no ombro dele, ficando atrás enquanto o menor ficava na frente.

- Vamos escoltá-lo até seu irmão, Radu.
Vlad sentiu seu coração apertar. Tinha se esquecido do seu irmão. Como poderia? Não sabia explicar, mas tinha se esquecido. Seu coração se apertou ainda mais quando colocou os pés no primeiro degrau da escada. O corredor era apertado. Apenas uma pessoa poderia passar por vez. Deixando Vlad no meio deles. Agora, teria que fazer sua escolha. Fugir, ou ver seu irmão.


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